quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Brics decidem criar banco e cimentam pontes com África


‘Decidimos iniciar negociações formais para fundar um novo banco de desenvolvimento do Brics, voltado para as nossas próprias necessidades em termos de infraestruturas, que são consideráveis (....), e para cooperar com os demais mercados emergentes e os países em desenvolvimento’, declarou o Presidente sul-africano, Jacob Zuma, o anfitrião da V Cimeira dos Brics que decorreu na passada semana perto de Durban. Os cinco países voltarão a abordar o tema durante a reunião do G20 (de potências industrializadas e emergentes) de São Petersburgo, na Rússia, em Setembro próximo. Zuma havia anunciado, durante a sessão plenária da Cimeira, que ‘os Brics haviam decidido estabelecer um novo banco de desenvolvimento’. A contribuição de cada país membro e o capital do banco estão ainda por determinar, sublinhou Zuma, acrescentando que a instituição irá servir como complemento a instituições financeiras internacionais já existentes, como o Banco Mundial (BM) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), que os BRICS consideram ser excessivamente controlados pelos EUA e Europa.
CAPITAL DO NOVO BANCO A AFINAR
Por afinar estará ainda pois o capital social da nova instituição. O ministro russo das Finanças, Anton Silaunov, destacou que o Brics deve ainda chegar a um acordo sobre a soma que cada país fornecerá ao capital. O novo banco poderá ser dotado, segundo os estudos, com um capital inicial de USD 50 mil milhões, cabendo a cada país que integra o grupo um contributo de USD 10 mil milhões em média. Muitos sul-africanos perguntam-se como reunir tal quantia, que corresponde a 2,5% de seu PIB. Além disso, os russos não parecem muito entusiasmados e propõem um contributo inicial de USD 2 mil milhões por país.
A ideia de criação de um banco desenvolvimento associado às quatro potências emergentes reunidas na sigla BRICS (Brasil, China, India e África do Sul) não é nova. Foi lançada pela primeira vez durante uma reunião de ministros das Finanças e dirigentes dos bancos centrais dos Brics no México. A decisão de criar um banco de desenvolvimento específico para a região dos Brics foi tomada em Março de 2012, na IV cimeira do grupo que teve lugar na Índia, em Nova Deli. Pretende-se que a nova instituição seja uma espécie de alternativa ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Para os indianos o objectivo é estabelecer um mecanismo que permita o financiamento de projectos exclusivamente nos países em desenvolvimento. 
INSTITUIÇÃO DEVERÁ FINANCIAR 10 PROJECTOS AFRICANOS
Entretanto, o ministro das Relações Exteriores de Angola, citado pelo Jornal de Angola, revelou o novo banco de desenvolvimento anunciado na África do Sul, deverá financiar 10 projectos em África. Georges Chicoti acrescentou que os 10 projetos sairão de uma lista de 50 que vai ser elaborada pelo chefe de Estado senegalês, Macky Sall, presidente em exercício da Nova Parceria para o Desenvolvimento de África (NEPAD). O NEPAD é o órgão da União Africana que analisa e estuda os projectos de desenvolvimento do continente.
 Um outro projecto que recebeu luz verde dos Brics na Cimeira de Durban foi o chamado Arranjo de Reservas de Contingência - um fundo de USD 100 mil milhões que servirá para socorrer países com problemas de liquidez financeira. Para a Presidente brasileira, Dilma Rousseff ‘trata-se de um acordo importantíssimo porque estamos assistindo a uma grande volatilidade no mundo. Tivemos a crise do Lehman Brothers em 2008, recentemente o problema em Chipre e tudo que ocorreu no ano passado com os países europeus’. Os Brics chegaram ainda a um acordo de cofinanciamento para projectos de desenvolvimento de energia limpa e infraestrutura na África. Outra novidade do encontro foi a criação do Conselho Empresarial dos Brics, um órgão formado por cinco empresários de cada país que vai dar sugestões e fazer avaliações sobre como ampliar a cooperação econômica e comercial no bloco. Para completar, o presidente russo, Vladimir Putin, anunciou que será realizado em Moscovo, em Junho, o primeiro encontro sobre política antidrogas dos Brics.
Na declaração conjunta, os Brics também procuraram pronunciar-se sobre os mais diversos temas da agenda política global - desde o conflito na Síria e na República Centro Africana até a admissão da Palestina como membro observador da ONU e o programa nuclear iraniano.
Alguns dos textos das declarações, porém, são bastante vagos, permitindo aos cinco países acomodar (ou esconder) as diferenças nos seus posicionamentos, segundo analistas.
PRESENÇA DO PRESIDENTE ANGOLANO
Angola esteve presente nesta Cimeira dos Brics ao mais alto nível, fazendo-se representar pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, convidado para o encontro. Outros nove Chefes de Estado africanos foram convidados para a cimeira, alguns dos quais representaram igualmente organizações regionais, como é o caso de Macky Sall, do Senegal, que é o actual presidente da Nova Parceria para o Desenvolvimento de África (NEPAD) e a quem coube apresentar à Cimeira de Chefes de Estado do BRICS dez projectos de integração económica de várias regiões africanas, devidamente estruturados e em condições de serem financiados. A anteceder o fórum, os líderes africanos acertaram posições numa reunião onde estiveram presentes o ministro de Estado e Chefe da Casa Civil, Edeltrudes Costa, e pelo ministro das Relações Exteriores, Georges Chicoti.Entre os projectos apresentados pelo NEPAD à Cimeira do BRICS inclui-se o financiamento da  que pode vir a ser a maior barragem do mundo, a Inga III, a leste do rio Congo, na República Democrática do Congo (RDC), e da qual se espera que contribua para aumentar em 30% a produção de electricidade do continente. O NEPAD apresentou igualmente o projecto de construção de uma auto-estrada que ligará a Costa do Marfim ao Togo, e uma outra que ligará os Camarões ao Chade. Há também o projecto de ligação rodoviária entre Dakar e Djibuti, passando pelo deserto do Saara. O ministro angolano Georges Chicoti referiu ainda o projecto de uma ligação por terra entre a parte Leste do Congo e os portos da África do Leste.
INCERTEZAS
Acontece que esta cimeira dos Brics na cidade sul-africana de Durban foi a primeira realizada num um clima marcado por grandes incertezas económicas para este clube de países emergentes. Apesar da OCDE ter estimativas optimistas para a China, que aparentemente inflectem a desaceleração da potência asiática, o Brasil vem crescendo a um ritmo de menos de 1% ao ano. A OCDE, no seu mais recente relatório sobre a economia chinesa, estima que o produto interno bruto chinês crescerá 8,5% este ano e 8,9% no próximo. Esta cimeira procurou tapar as fissuras que vêm sendo observadas por alguns analistas. Bob Davis, correspondente de The Wall Street Journal em Pequim, considerava ainda há pouco tempo que ‘a esperança de que os países dos Brics se ajudariam entre si, aumentando o comércio, o investimento e o apoio político, esvaiu-se. Autoridades e analistas dos Brics afirmam que eles agem tanto como concorrentes quanto como aliados e que um dos seus problemas reside nessa falta de coesão’. Terão saído de Durban mais decididos e mais coesos? Fizeram crer que sim.
BRICS: DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS
A sigla Bric surgiu pela primeira vez em 2001, quando o economista Jim O´Neil, chefe de pesquisa em economia global do grupo financeiro Goldman Sachs, realizou o estudo ‘Building Better Global Economic Brics’ (‘Construindo uma melhor economia global Brics’). Jim O´Neil reformou-se há poucas semanas mas a sigla persiste, cheia de popularidade, e alargou-se, acrescentando-se-lhe agora um ‘s’ de South Africa. Com efeito, a África do Sul juntou-se ao grupo em finais de 2010. O estudo da Goldman Sachs acentuava o potencial económico daqueles países, que pode transformá-los nas quatro economias dominantes do mundo, até 2050 (a avaliação foi feita antes da adesão da África do Sul ao bloco). E chamava a atenção das grandes empresas para os mercados de consumo médio que os Bric estavam a erguer. Segundo o Goldman Sachs, o mercado consumidor de produtos industrializados nas economias emergentes deverá crescer na casa dos USD 10 triliões (valor duas vezes maior que o PIB do Japão – a segunda maior economia do mundo - em 2009). A Goldman Sachs aponta, num relatório recente, as razões e as oportunidades que surgirão com o protagonismo dos emergentes nas próximas décadas. Os sectores de consumo, infraestrutura e commodities terão aumentos ‘drásticos’ devido ao crescimento da classe média dos países emergentes.
‘Cada um dos Brics apresenta uma trajectória distinta embora todos eles tenham conseguido desenvolver uma certa estrutura industrial. Tratam-se, no entanto, de estruturas bastante distintas e construídas em épocas diferentes. Todos utilizaram as tradicionais políticas económicas: câmbio desvalorizado, política fiscal expansionista e política de crédito abundante. A grande diferença é a estratégia que cada um adoptou em seu processo de industrialização”, assinala Rubens Sawaya, professor do departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo. Mas os Brics apresentam mais alguns pontos em comum: todos possuem uma grande extensão territorial, abundância em recursos minerais e mão de obra. Em todos eles o Estado assume grande protagonismo como indutor e promotor do desenvolvimento industrial de maneira bastante expressiva nos últimos cinquenta anos, apesar da China ser comunista, a Rússia já ter sido socialista e Índia e Brasil serem capitalistas. Outro ponto em comum é a abertura económica promovida por eles na década de 90.

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