segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Do Batuque ao Samba

Do Batuque ao Samba, um rápido histórico das danças afro–brasileiras.

Por David J. Santos
Professor de História
Chega o Carnaval. No Rio de Janeiro, o domínio é do samba, os passistas tomam conta do Sambódromo . Nas ruas da Bahia, predominam as bandas de axé, os afoxés e ilês. Porém de onde saiu tudo isso? Quem foi a matriz desses ritmos e danças afro-brasileiros? A você leitor, faço o convite para que neste texto, venha conhecer algumas das danças que antecederam aos atuais ritmos que hoje são referência de nossas heranças culturais negras.
Devido a diáspora do tráfico negreiro, os africanos vieram para o Brasil , trazidos nos tumbeiros (navios de transporte de escravos, também conhecidos como negreiros) , sendo dispersos por nosso território, para trabalharem nos grandes centros urbanos ou nas áreas produtoras agrícolas e de extração mineral. Nestas regiões ,recriam sua forma de visualização do mundo , sendo sua cultura influenciada ,não somente pelos costumes locais, como também , pela diversidade cultural dos diversos grupos africanos que iram se encontrar na mesma situação de cativo. A música e a dança, além de outras formas de expressão cultural, serão utilizados como forma de manutenção da identidade africana , como também será uma formadora de novos laços solidariedade e relação social ,já que suas antigas relações , foram desfeitas , seja no embarque na África ou na dispersão indivíduos de tribos semelhantes pelo território, onde se buscava exatamente a destruição desses laços.
A música e a dança, possuem presença marcante na cultura original desses indivíduos, seja em suas comemorações, passando até mesmo pelos ritos religiosos, e aqui servindo até como forma de amenizar as dores da escravidão. Mas como já mencionado anteriormente ,vão sofrendo adaptações aos costumes locais e até mesmo vão sendo incorporados a cultura local .A seguir veremos alguns desses ritmos:
Batuque: O viajante Johann M. Rugendas , que no século XIX esteve no Brasil, o descreve da seguinte forma:
A dança habitual do negro é o batuque... ouve a batida cadenciada das mãos... consiste em certos movimentos do corpo que talvez pareçam demasiado expressivos, são principalmente as ancas que se movem.(...)”
No Brasil, o batuque , se inicia nos terreiros e vai sendo introduzido nas práticas católicas, apesar das autoridades eclesiásticas não verem tal dança com bons olhos , por a acharem imoral devido seus movimentos, principalmente das ancas .Mesmo assim, eram estimuladas a prática e participação nessas festas, os senhores de escravos, viam como uma forma de dissimular o contraste social em que viviam assim coibindo possíveis tensões provocadas por essa percepção. Porém as autoridades se mantinham vigilantes nas manifestações, pois imaginavam ser essas reuniões, um momento propicio para revoltas e levantes de escravos, devido a grande concentração destes. Para os negros, era um bom momento de encontro, confraternização e criação de laços de solidariedade, já que algumas vezes, os festejos católicos acabavam, e os escravos continuavam o batuque até o dia seguinte, porém também serviam para conspiração e planejamento de fugas. Segundo escritos da época, sua origem seria a África Centro-Oriental, especificamente do Congo e de Angola, onde se denominava “batuco”.
Lundu: Também conhecido como umbigada, Era dançado aos pares, onde em determinados momentos, os dançarinos avançavam em direção ao umbigo de seu par. Ritmado inicialmente pela marcação das palmas, sofre a incorporação de instrumentos de corda, a medida que vai sendo aceito e praticado por pessoas de outras camadas sociais. O Lundu, chega até aos salões de Portugal. Dentre os seus apreciadores, podemos citar Dona Beija, que não deixava faltar o lundu em suas famosas festas em Araxá-MG.
Maxixe: Final do século XIX, no Rio de Janeiro, surge uma adaptação popular da polca (ritmo de origem européia), onde sofre grande influência do Lundu e do batuque, apresentando seus movimentos requebrados, sendo seu principal instrumento o piano. O maxixe alcança seu auge entre 1880 e 1930, quando sai da esfera popular e invade os salões da elite fluminense. Invade as ruas e teatros, por meio dos cordões carnavalescos e o teatro de revista, seus principais veículos de divulgação.
Samba: Palavra derivada do termo “semba’, que em quibundo significa - movimento pélvico, porém em quioco de Angola ,significa - brincar ,divertir-se.
Durante a segunda metade do século XIX, muitos escravos, migram da Bahia para o sudeste. No Rio de Janeiro, se estabelecem em uma região que abrangia desde a Pedra do Sal (Morro da Conceição, atual Praça Mauá) até a Cidade Nova, próximo ao Sambódromo, esta área seria conhecida como “Pequena África”, onde era constante a prática do chamado samba rural, ao som das palmas , do pandeiro e do raspar de facas em pratos, e dançado a moda da umbigada. Com o advento da reforma urbana do Rio de Janeiro, a Pequena África e desfeita e a população negra se desloca para os morros da cidade, assim também marcando o surgimento do samba urbano carioca.
Em 1876, Hilária Batista de Almeida ,nascida em Salvador, então com 22 anos, chega ao Rio de Janeiro onde ficaria conhecida como Tia Ciata. Morava próximo a região da atual estação ferroviária da Central do Brasil. Filha de Oxum e sendo Mãe de Santo, organizava suas festas dedicadas aos orixás, onde não podia faltar o samba , ainda mais reunindo os então desconhecidos, Sinhô, João da Baiana, Heitor dos Prazeres, Pinxinguinha e Donga, que futuramente seriam reconhecidos como grandes músicos e compositores do nosso país, sendo até hoje cultuados nas melhores rodas de samba do Brasil.
Em 1916, Donga e Mauro de Almeida, escrevem Pelo Telefone, que veio a ser o primeiro samba gravado.
Dos terreiros e manifestações religiosas, dos primeiros negros que chegaram ao Brasil, surgem os sons de atabaques e tambores, que durante muitos anos soavam os lamentos do cativeiro ou a revolta dos quilombolas. Porém ao passar das areias da História , o atabaque recebe o acompanhamento do piano e do violão e se transforma,deixando de ser lamento africano, virando expressões da cultura brasileira.
Caro amigo leitor. Sei que fiquei devendo escrever sobre o coco, o jongo, o afoxé, o tambor de crioula ... fiquei devendo muita coisa! Peço desculpas, mas terá de ficar para um próximo encontro, entre as letras e a sua sede de leitura.
 

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